Ginásio Paulo Sarasate foi a casa dos grandes shows em Fortaleza; Relembre atrações nestes 51 anos

Principal opção para mega eventos no passado, praça esportiva sediou musicais, shows intrernacionais, espetáculos infantis e aproximou os cearenses da geração Rock BR dos anos 1980

Foto: Ana Aragão

Em 51 anos de trajetória, o Ginásio Paulo Sarasate sediou eventos para o mais diferentes públicos. Além de atender à exigência das demandas esportivas, o equipamento público de Fortaleza também possui notável relação com a cultura, comportamento, política e educação da cidade.

O número 2050 da Rua Ildefonso Albano testemunhou grandes concertos musicais, sejam shows voltados à criançada ou aos adultos. Por meio do Paulo Sarasate, a população fortalezense conheceu a geração Rock BR dos anos 1980. Boa parte dessa turma passou por aqui naquele efervescente momento. Legião Urbana, Paralamas do Sucesso, RPM, Engenheiros do Hawaii, entre outros sucessos.

A praça esportiva permitiu a realização de eventos que exigiam maior estrutura de palco e som. Com isso, artistas de renome internacional como A-ha e Nina Hagen marcaram presença no Ceará. Sumidades da MPB, Sertanejo e pop também encantaram o público com noites memoráveis. Relembramos algumas das apresentações que marcaram este tradicional ponto cultural de Fortaleza.

É NOITE DE ROCK, BEBÊ

O Sarasate fez a cabeça da turma que apreciava um bom rock. Como a maioria dos shows se concentravam no Sudeste, os produtores precisavam driblar as dificuldades de logística. Mesmo assim, vários artistas nacionais trouxeram sua arte para Fortaleza.

E o Ginásio testemunhou a primeira passagem de Raul Seixas (1945-1989) pela capital cearense. O ano é 1977 e o baiano participou de festival com Erasmo Carlos, Conjunto A Bolha e As Frenéticas. Ele voltaria em 1983, dessa vez no Ginásio Aécio de Borba. 

Ginásio Paulo Sarasate em 1971
Legenda: Ginásio Paulo Sarasate em 1971Foto: Nelson F Bezerra Arquivo Cidade Saudade Fortaleza décadas 1970 80

Raulzito retornou ao Paulo Sarasate em janeiro de 1989, durante a série de apresentações da turnê “A Panela do Diabo”, ao lado de Marcelo Nova (Camisa de Vênus). Reportagem do Diário do Nordeste relata que a noite teve quebra-quebra e confusão da polícia com o público. Era a última vez de Raul Seixas em chão cearense. O músico morreu em agosto daquele mesmo ano.

“Inobstante as acusações de que o público jovem e o próprio Raul Seixas teriam sido os principais responsáveis pelo quebra-quebra ocorrido na última quarta-feira, no ginásio, algumas pessoas disseram que a Polícia também contribuiu bastante para o acirramento dos ânimos da garotada”, descreve publicação do Diário do Nordeste do dia 21 de janeiro. “Levei duas bordoadas de um tenente, sem estar fazendo nada”, disse o produtor João Carlos Diógenes. 

Imagem aérea do Ginásio durante reforma em 1988
Legenda: Imagem aérea do Ginásio durante reforma em 1988Foto: Neysla Rocha

Os anos 1980 consolida o processo de reabertura política do Brasil. E o rock nacional asiste à chegada de toda uma nova geração de artistas. Além de Rita Lee e Roberto de Carvalho (em 1983), a casa recebeu Marina (1987), Paralamas do Sucesso (1988), “Kid Abelha e Os Abóboras Selvagens”, RPM (1989), Engenheiros do Hawaii (1990).

Um dos principais grupos dessa fase, a Legião Urbana, esteve no Sarasate por duas oportunidades. A primeira em 1988, com o giro do disco “Que País é Este”. Em 1990, já como trio (com a saída de Renato Rocha), os legionários retornaram em “outro patamar”.

“Trio Legião Urbana volta a Fortaleza depois de mais de dois anos. A apresentação única será hoje, a partir das 22 horas, no Ginásio Coberto Paulo Sarasate. Vem sendo considerado o show mais caro do ano, pois o ingresso está sendo cobrado a Cri 1.500,00. O promotor do espetáculo explica: ‘É um show caro, no patamar dos internacionais’. 

TEM ESTRANGEIRO NO PAULO SARASATE

A eterna Garota de Berlim provou da brisa cearense. Em setembro de 1985, Nina Hagen realizou a quinta apresentação (do total de 14 pelo Brasil). Naquela ocasião, a cantora elogiou a receptividade dos nordestinos e salientou, em entrevista par Soraya de Alencar, que a imprensa do Rio de Janeiro a “odiou”. “Ela enfatiza que os jornalistas que a criticaram estão recebendo ‘dinheiro do diabo'”. Vai de retro. 

Noruegueses do A-ha
Legenda: Noruegueses do A-haFoto: Ana Aragão

Os ianques do Information Society desembarcaram no Ceará em 1991. A única apresentação no Ginásio Coberto Paulo Sarasate chegava com pompas de maior turnê de um grupo pop internacional em território brasileiro. “Um fato curioso é que o grupo norte-americano não faz sucesso nem nos Estados Unidos, nem na Europa, mas encontrou no Brasil solo fértil para a sua ‘music dance'”, descreveu cobertura do Diário do Nordeste. 

Naquele mesmo ano, o A-ha mostrou aos cearenses a razão de ser a banda pop “mais quente” daquele período. A comoção era das grandes. Donos de hits como “Take On Me”, “Hunting High an Low”, os noruegueses precisaram de forte aparato de segurança, incluindo escolta do antigo Aeroporto Pinto Martins para o hotel.

Antes mesmo dos portões abrir, longas filas se concentravam do lado de fora do Ginásio Paulo Sarasate
Legenda: Antes mesmo dos portões abrir, longas filas se concentravam do lado de fora do Ginásio Paulo SarasateFoto: Ana Aragão

O grupo e sua comitiva seguiram até o hotel com uma desnecessária escolta. Era feriado e o trânsito fluía tranquilamente. Morten, Mags e Pai até se assustaram com o pouco movimento nas ruas. E a falta de um intérprete no automóvel que transportava o grupo, impediu a explicação que eles estavam chegando num feriado”. 

DIÁRIO DO NORDESTE 02/06/1991

Na noite anterior ao show, parte da comitiva do grupo foi conhecer a movimentação das barracas de praia e a trindade “caranguejo-forró e areia” das noites de quinta de Fortaleza. Quanto à apresentação no Paulo Sarasate, nada de incidentes maiores e o concerto foi elogiado.

Os portões abriram às 18h (com show marcado para 21h30), mas já tinha fila do lado de fora. Os shows no Paulo Sarasate são verdadeiras minas para os vendedores ambulantes, provenientes dos mais diversos bairros da cidade. Tinha de caipirinha a queijo torrado, descreveu o repórter Abílio Gurgel. Pôster, cordão neon… A gama de produtos era farta.

A turma dos ambulantes aproveitou a ótima presença de público
Legenda: A turma dos ambulantes aproveitou a ótima presença de públicoFoto: Ana Aragão

“Para quem não tinha maiores atrativos no seu produto, o jeito foi apelar para a originalidade, como um ambulante que aos gritos anunciava: “Olha o pirulito, chiclete e ‘A-Halles’ (Hall)”. Deve ter acabado o estoque”. 

CADÊ O FOFÃO QUE PROMETERAM? 

Nem só os adultos fizeram festa nas dependências do Sarasate. Apresentações exclusivas para os pequenos também integram a jornada deste meio século de existência. Em dezembro de 1983, Renato Aragão deu o ar da graça na terrinha por uma causa nobre.

O Trapalhão trouxe na bagagem o espetáculo “A Arca de Noé”, cujo elenco incluía Sérgio Mallandro, Teddy Boy Marino, entre outros nomes do elenco. Unindo humor, jogos, números de circo, cenas de luta livre e boxe, o show teve renda destinada à Missão Asa Branca, detalhou publicação do Diário do Nordeste daquele ano.

Devido à arquitetura moderna, o Paulo Sarasate se assemelha a um disco voador de ficção científica. Falando em objetos interplanetários, quem domina a área é a eterna Rainha dos Baixinhos. Nos anos 1980, todas às manhãs, Xuxa pousava sua cintilante nave nos estúdios da Rede Globo. Em 1987, o Sarasate ficou pequeno para o encontro com a apresentadora. 

Xou da Xuxa com grande presença de público
Legenda: Xou da Xuxa com grande presença de públicoFoto: Kiko Silva

Em meio a euforia e agitação sempre constantes no espetáculo, muitas crianças se perderam dos pais; enquanto outras, com sorriso nos lábios e olhos brilhantes, viveram uma hora e meia de total descontração”

DIÁRIO DO NORDESTE 05/04/1987

Em julho de 1983, cerca de quatro mil pessoas foram ver a Turma do Balão Mágico. O grupo infantil era sucesso de audiência e vendas. Logo no início do show, as crianças invadiram a área próxima ao palco e o evento foi interrompido. Se a criançada era só euforia, o mesmo não se pode dizer dos pais. Explica-se. Fofão, um dos personagens mais querido do televisivo infantil, não estava na apresentação.

Tob, Simony e Mike: Balão Mágico em Fortaleza
Legenda: Tob, Simony e Mike: Balão Mágico em FortalezaFoto: Mário Tadeu

“No final do show, foram várias as mães que estavam revoltadas com a ausência do “Fofão”, querendo, inclusive, o ingresso de volta, que foi cobrado ao preço único de Cr$ 1 mil (Hum mil cruzeiros)”.

Ausência de Fofão irritou os grandinhos
Legenda: Ausência de Fofão irritou os grandinhosFoto: Mario Tadeu

CAETANO RECLAMOU DA CENSURA

Medalhões da MPB encantaram a plateia da praça esportiva. A lista de estrela inclui Kleiton e Kledir, Roberto Carlos, Beth Carvalho, Gilberto Gil, Alceu Valença, Djavan, Fagner, Beto Guedes… Destacamos duas apresentações em especial. 

Em janeiro de 1983, mais de 15 mil pessoas lotaram o Sarasate para dançar e cantar com Ney Matogrosso. Um excelente público, vale dizer. Um ano antes, em julho, foi a vez de Caetano Veloso contagiar a capital.  “De repente o ginásio ficou pequeno para suportar e acolher as pessoas que queriam ver o ídolo maior da música popular brasileira”, descreveu reportagem do Diário do Nordeste. 

Mais de 15 mil pessoas viram Ney Matogrosso
Legenda: Mais de 15 mil pessoas viram Ney MatogrossoFoto: Helder Freitas

Bem à vontade, o baiano desfilou clássicos como “Meu Bem, Meu Mal”, “Novos Baianos” e outras. Em momento só voz e violão, foi a vez de “Leãozinho”. Ao terminar a canção, Caetano conversa com a plateia e divide a tristeza com um fato ocorrido em Fortaleza.  

Prevista para ser apresentada no Theatro José de Alencar no dia anterior ao show, a peça “A Noite Seca” foi censurada pela Polícia Federal.  “A plateia vibra, aplaude com palmas e assovios e Caetano continua seu show com
a música ‘Terra’ que a multidão também canta junto”. 

Caetano em noite de clássicos e protesto
Legenda: Caetano em noite de clássicos e protestoFoto: Vidal Cavalcanti/ Diário do Nordeste 25 de julho de 1982

O ARQUITETO OLÍMPICO

Entregue em setembro de 1971, o projeto do ginásio multiuso foi concebido pelo arquiteto Ícaro de Castro Mello (1913-1986). Construído numa área de 5.850 metros quadrados, a capacidade prevista do equipamento era de 15 mil pessoas.

Reconhecido como um dos grandes nomes da arquitetura em projetos esportivos, o paulista tinha uma trajetória única. Chegou a participar da equipe brasileira de atletismo na Olimpíada de Berlim (1936). O “arquiteto-atleta”  também serviu no exército durante a 2ª guerra, o que o fez interromper as atividades como arquiteto até 1943. Entre inúmeros trabalhos assinados, Ícaro concretizou projetos para o Ginásio do Ibirapuera (1952), Recife (1969) e Brasília (1970).

Nelson F Bezerra Arquivo Cidade Saudade  Fortaleza décadas 1970 80 (2)
Legenda: Construção da Praça EsportivaFoto: Nelson F Bezerra Arquivo Cidade Saudade Fortaleza décadas 1970 80

O prédio situado no número 2050, da Rua Idelfonso Albano, homenageia o ex-governador e senador cearense Paulo Sarasate (1908-1968). Este espaço também colaborou com a democracia brasileira. Em eleições passadas, a contagem dos votos era realizada no ginásio. No pleito de 1982, por exemplo, o processo de apuração chegou a demorar oito dias. Algo distante à atual segurança e agilidade das urnas eletrônicas. 

Inúmeros cearenses lembram de algum especial momento no lugar. No correr das décadas, o complexo recebeu inúmeras feras do esporte, sejam elas amadoras ou até de renome internacional. Abriu as portas à folia do Carnaval, às atividades religiosas e manifestações populares como as quadrilhas juninas. 

Fonte:https://diariodonordeste.verdesmares.com.br

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